sábado, 26 de maio de 2012

Pedaços de vida #9

         Levantou-se da desgastada poltrona e arrastou-se pela poeirenta habitação até à janela. Parecia encravada. Talvez fosse o jeito, talvez força que faltasse àquelas tremules mãos.
        Por fim, o fecho cedeu perante tamanha persistência. A sala foi, então, trespassada por uma forte luz, invadida por cheiros de primavera, e o silêncio interrompido por cantar de pássaros que acolhiam o velho numa paz singela.
         Na rua passava gente apressada e alguns cães vadios.
         Estarão as crianças na escola?
        Ali ficou horas, absorto de si mesmo e da vida por viver. Apenas deu pelo cair da noite quando a lua apareceu resplandecente no alto.
          Há um homem da lua que ainda lá vive.
         E, assim, nem a lua é tão só como um homem que à janela tem sonhos que o acordam. É este o momento em que aguarda pelas respostas duvidosas de quem dele diz cuidar, aguarda pelo milagre da medicina, aguarda pelo desfecho da existência.
         Enquanto isso, fecha os olhos. Terá ainda tempo de sonhar. Todo o homem sonha, até o homem da lua.

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;D